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Índios estudam comercializar carbono da bacia do Xingu

Índios estudam comercializar carbono da bacia do Xingu

Sérgio Adeodato para o Valor Econômico

A bacia do rio Xingu, cenário da polêmica envolvendo a construção da hidrelétrica de Belo Monte (PA) e seu potencial risco de impactos ambientais, guarda um dos maiores estoques globais de carbono, com total de 3,2 bilhões de toneladas, segundo recente mapeamento realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. Trata-se de uma reserva que corresponde a quase toda a emissão do planeta durante o ano inteiro – patrimônio hoje estudado para gerar dividendos aos povos indígenas no mercado de REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação).

“As comunidades indígenas estão dialogando para tomar uma decisão até julho”, revela André Villas-Bôas, coordenador do Programa Xingu, do Instituto Socioambiental (ISA). O objetivo com a “venda” de serviços ambientais é agregar valor à produção extrativista. “O carbono é uma saída na urgência de se criar mecanismos econômicos para manter as florestas”, justifica Villas-Bôas. Ele diz que “a sustentabilidade indígena contempla essas novas demandas”. Ele conta que, nas consultas realizadas, os grupos demonstraram interesse em utilizar os recursos para investir em infraestrutura (educação e transportes), segurança alimentar, associativismo, proteção e fiscalização e fortalecimento cultural para a conservação da identidade e modos de vida.

Na região do Xingu, os índios têm o poder sobre 1,36 bilhão de toneladas de carbono, um terço do total das emissões relativas ao uso da terra no planeta, o que equivale a R$ 17 bilhões com base nos atuais valores de mercado. Parte significativa está nas reservas dos caiapós, que são as mais extensas e formam um corredor de área protegida com 8 milhões de hectares na conexão com o Parque Indígena do Xingu, no Mato Grosso. “A situação dos caiapós para ingressar no mercado de carbono é satisfatória, porque já estão estruturados em associações e têm maior capacidade para entender as questões contemporâneas”, explica Villas-Bôas. É preciso garantir, segundo ele, melhor estrutura de gestão com mecanismos de controle social, caso contrário “o mercado de carbono pode ser um desastre”.

A expectativa é o comércio de carbono evitar a degradação. A bacia do Xingu estende-se por 51,1 milhões de hectares, reunindo 24 povos indígenas dentro de diferentes paisagens, mas 20% da área está desmatada. A destruição é maior fora das reservas e outras áreas protegidas, que cobrem a metade da bacia. Nas cabeceiras do Xingu, como conseqüência da expansão da soja, 400 mil hectares de nascentes e matas das margens estão degradadas.

Os índios do Xingu seguem o modelo dos suruís, em Rondônia, que há três anos discutem o melhor caminho para entrar no mercado de carbono. O processo é apoiado por diversas associações e organizações não-governamentais, como a americana Forest Trends. “Atualmente estamos quantificando o carbono, estimado preliminarmente em 10 milhões de toneladas, para depois o projeto ser validado e apresentado a investidores”, informa Mariano Cenamo, do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia.
Até o final deste ano, estima-se a primeira venda de carbono por índios brasileiros, com a aplicação da receita em atividades de produção sustentáveis, mudando a realidade atual. Hoje os suruís, no total de 1,2 mil índios em 27 aldeias, têm parte de seus 247 mil hectares invadidos por madeireiros ilegais que praticam desmatamento.

A receita do carbono com a conservação da floresta é parte de um plano estratégico para o desenvolvimento da terra indígena nos próximos 50 anos. A proposta se multiplica. Na região, também os vizinhos cinta-larga, famosos pela exploração de diamantes no passado, cogitam o mercado de REDD+ como fonte de renda.

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