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Primeira viagem à Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã

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Primeira viagem à Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã

Por Aline Radaelli, pesquisadora do Programa de Manejo Florestal do Idesam

Quatro horas de viagem de carro e mais uma hora e meia de voadeira: assim começou nossa viagem de três dias à Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã, localizada entre os municípios de Itapiranga e São Sebastião do Uatumã, no Amazonas.

Nossa visita foi uma atividade da Incubadora de Negócios Florestais do IDESAM e teve dois objetivos principais: repassar informações à respeito da primeira atividade de venda da Incubadora, realizada nas feiras de Manaus (saiba mais aqui), e combinar com os comunitários a data do próximo escoamento dos produtos. Com isso queremos incentivar a participação de cada vez mais produtores locais nas atividades da Incubadora.

A estrada, inicialmente com muitos buracos, foi se mostrando tranquila no restante do percurso, principalmente na “Estrada da Várzea”, como é conhecida a rodovia AM-363. Essa estrada recentemente foi recuperada em função de sua importância para o escoamento da produção rural dos municípios próximos, principalmente a madeireira.

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Seja o asfalto bom ou ruim, uma coisa é constante: todo o percurso que liga Manaus a Itapiranga (e seus 356 km) nos oferece paisagens bastante agradáveis, seja de florestas densas, campinas ou as constantes áreas alagadas repletas de buritizais.

Chegamos no município de Itapiranga por volta de meio dia e almoçamos em um dos restaurantes locais. Compramos alguns suprimentos, como alimentos e combustível, e seguimos para o porto de Itapiranga, onde a voadeira do Idesam já estava preparada para nossa viagem.

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Seguimos então pelo Paraná de Itapiranga rumo ao rio Uatumã.

Logo nos primeiros minutos de voadeira, ao pegarmos um atalho por um furo*, pude ter o prazer de ver uma preguiça subindo lentamente o tronco de uma árvore e nos olhando curiosa… várias espécies de aves também nos deram as boas vindas.

Enfim chegamos ao Uatumã, não contive meu espanto diante de sua grandiosidade e beleza. Conhecido principalmente em função da pesca esportiva e dos tucunarés que oferece aos seus visitantes, o Uatumã é um dos grandes rios do Amazonas: são 660 km de extensão desde sua nascente, na divisa entre os estados do Amazonas e Roraima, até seu encontro com o grande Rio Amazonas.

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Da sede de Itapiranga até a casa do comunitário José Monteiro, o “Papa” (que frequentemente é transformada em albergue para turistas e pesquisadores) são cerca de 60km via fluvial, equivalentes a 1h30 de barco, dependendo da potência do motor.

Chegamos à casa de nosso anfitrião no fim da tarde e dedicamos o resto do dia ao planejamento dos nossos próximos passos. O plano era subir toda a RDS no período da manhã seguinte, almoçar em alguma comunidade próxima, e descer o rio parando para conversar com os interessados em enviar sua produção para Manaus. Um plano ambicioso, considerando a extensão da reserva. Mas aceitamos o desafio.

Na manhã seguinte, acordamos cedo e, depois de um rápido café, seguimos para a comunidade do Caranatuba, onde encontramos o Alcir Queiroz, filho de um grande parceiro do Idesam, Seu Aldemir, um senhor incrível e sábio, de intenso brilho nos olhos. (Vale a pena conferir o depoimento dele aqui)

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Alcir foi nosso guia e companheiro durante o resto da viagem (Uatumã acima) e nos ajudou a evitar atrasos e imprevistos.

Nosso percurso se estendeu até a comunidade do Maracarana, a terceira comunidade da reserva. Chegamos quase na hora do almoço (foram mais de três horas de voadeira) e fomos muito bem recebidos pelo Seu Manoel, que nos contou parte de sua bonita história de vida, incluindo sua viagem aos Estados Unidos para tratamento de um câncer e o processo de criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã.

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Nos despedimos de seu Manoel e sua família e seguimos para as outras comunidades, sempre encontrando uma receptividade muito boa das pessoas sobre a proposta da Incubadora. Tucumã, cupuaçu e castanha são os produtos de maior oferta nesse período do ano e muitos comunitários se comprometeram a apresentar sua produção.

No caminho de volta à comunidade do São Francisco já sem a companhia do Alcir, que havia ficado em Caranatuba, a noite caiu rapidamente e nos deparamos com um “perrengue”. Estávamos sem pilha no GPS, e somente com a luz da lua seria impossível localizar a casa do Papa, que fica um pouco afastada da comunidade.

A alternativa foi voltar até a comunidade anterior e conseguir as pilhas para o GPS e uma lanterna. Depois disso conseguimos reencontrar nosso caminho sem novas surpresas.

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Mais uma noite tranquila na reserva do Uatumã.

O dia seguinte foi de mais visitas, dessa vez rio abaixo, aproveitando o caminho de volta para Itapiranga. Foi a vez das comunidades Livramento, Jacarequara, Cesaréia, Bom Jesus, Boto e Amaro.

Novamente pudemos perceber uma boa receptividade dos comunitários para a Incubadora, o que é sinal de que estamos no caminho certo. Com um número cada vez maior de produtores envolvidos, e com o apoio técnico do Idesam, esperamos alcançar uma constância na oferta desses produtos e fidelizar possíveis mercados consumidores.

Além disso, esse tipo de atividade estimula a união entre os comunitários em torno de um objetivo comum, proporcionando acréscimo na renda familiar de cada produtor e melhoria da qualidade de vida de todos.

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No caminho de volta a Manaus, chuva e neblina durante grande parte do percurso aumentaram nosso tempo de viagem em aproximadamente duas horas. Chegamos depois das 22h, cansados, mas com a sensação de dever cumprido.

Além das pessoas que pude conhecer e conversar, ficam na memória os momentos incomuns cheios de emoção, como o momento em que a voadeira trombou em um tronco de árvore e nos fez perceber que estávamos navegando em cima da floresta alagada; ou quando, na última comunidade, fomos surpreendidos por uma tempestade que nos deixou 40 minutos parados dentro do barco esperando o rio acalmar para seguir caminho.

Acredito que esses pequenos perrengues e particularidades de uma viagem são que a fazem inesquecível e especial. E é assim que vejo minha primeira ida à RDS do Uatumã.

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