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Estudo mostra impactos da BR-319 em municípios da Amazônia

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Estudo mostra impactos da BR-319 em municípios da Amazônia

Análise de 13 municípios dos estados de Amazonas e Rondônia aponta alta no desmatamento, aumento da pecuária e avanço sobre terras indígenas

 

Por Henrique Saunier

 

O Idesam lançou, no último dia 10, o estudo Análise Ambiental e Socioeconômica dos Municípios Sob Influência da rodovia BR-319. Os dados da publicação – que integra o Projeto BR-319: Acompanhamento e Recomendações – apontam Porto Velho, Lábrea, Manicoré e Autazes como as regiões com a maior quantidade de área desmatada acumulada até o ano de 2016. Somente esses quatro municípios foram responsáveis por 1,7 milhão dos 2,3 milhões de hectares devastados em todas as 13 cidades analisadas. O lançamento do estudo contou com uma rodada de discussão sobre como esse e outros problemas intensificados pela reconstrução da rodovia podem ser minimizados.

Além dos já citados, Manaus, Careiro da Várzea, Careiro, Manaquiri, Beruri, Borba, Tapauá, Canutama e Humaitá também foram analisados, por estarem diretamente ligados, ou por possuírem alguma estrada com conexão à rodovia, alvo de muitas polêmicas. Segundo o estudo, o intervalo mais controverso da rodovia BR-319 é o chamado “trecho do meio”, que fica entre os quilômetros 250 e 656 e está sujeito a licenciamento ambiental, por necessitar de uma reconstrução total do pavimento.

A perda e degradação de habitat, poluição química, aumento da violência e atropelamentos de fauna foram alguns dos impactos negativos decorrentes da construção de estradas na Amazônia apresentados no lançamento do estudo, que destaca também a invasão antrópica como outro fator preocupante.

Este tópico ganha atenção especial na análise, visto que a invasão antrópica causada pela expansão rodoviária na Amazônia Legal vem acompanhada de graves problemas fundiários que propiciam a ocupação desordenada, a grilagem de terras, os conflitos e expulsão de populações tradicionais.

Uma das autoras do estudo, a coordenadora de políticas públicas do Idesam, Fernanda Meirelles, destaca que o documento traz conclusões que servem de alerta de que é preciso aumentar a governança nestes territórios, intensificar a atuação dos órgãos públicos e maior participação da sociedade civil em toda a discussão.

“Nessas áreas (destacadas no estudo) a ocupação está acontecendo de forma acelerada e o desmatamento crescendo numa velocidade muito grande. É importante que a regularização fundiária ambiental aconteça. A gente identificou muitas sobreposições de áreas declaradas do CAR (Cadastro Ambiental Rural) em Unidades de Conservação (UCs) e isso é muito problemático. É preciso uma checagem em campo dessas áreas declaradas, porque elas invadem terras indígenas e estão dentro das UCs”, alerta Meirelles.

Na análise específica da evolução do desmatamento, foram utilizados dados do Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite) a fim de contabilizar o desmatamento acumulado desde o ano 2000. Além disso, foram selecionadas áreas consideradas vulneráveis mediante a pavimentação da rodovia, e que foram analisadas separadamente, como é o caso da Vila de Realidade, pertencente ao município de Humaitá.

Um dos participantes da roda de discussão no evento foi o analista de projetos e pesquisa da Fundação Vitória Amazônica (FVA) Marcelo Santos, que destacou o impacto da rodovia federal não apenas no interior, mas também na Região Metropolitana de Manaus. “No caso da BR-319, consideramos críticos os locais onde serão construídas as estradas planejadas, o que configura uma nova via de acesso facilitada para áreas de floresta ainda intactas. Outros pontos (críticos) são Careiro e Humaitá, esta última em uma região ecologicamente importante de campinas amazônicas”, afirma Santos.

Participaram da mesa redonda Jolemia Cristina das Chagas (Casa do Rio), o deputado estadual Luiz Castro (Caama/Aleam), Marcelo Santos (FVA), Paulo Graça (Inpa) e Luciana Valente (MPF-AM). O lançamento foi realizado no Bosque da Ciência e o estudo já está disponível na íntegra neste link.

 

Desenvolvimento Social

Para entender os impactos da pavimentação da rodovia nesses municípios, os pesquisadores do Idesam analisaram não somente a dinâmica de desmatamento ao longo dos anos, mas também a evolução de indicadores socioeconômicos (como PIB e IDH), o ordenamento territorial, a infraestrutura e o uso da terra e produção rural de cada um deles.

Nesta análise, estão inseridas questões como o acesso a cuidados médicos básicos, água e saneamento, moradia, segurança, sustentabilidade dos ecossistemas, educação superior, entre outros fatores que comprovam o impacto social da rodovia.

Em 1991 — ano inicial da base de dados analisada — todos os municípios, com exceção de Manaus e Porto Velho, se encontravam com um IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) muito baixo. Em 2010, todos saíram dessa classificação subindo para as categorias de baixo a alto. Houve uma grande evolução no IDH desses municípios, com aumentos de 42% a 233%, nos vinte anos de análise. Os Estados do Amazonas e Rondônia e o Brasil aumentaram seu IDH em 57%, 70% e 48%, respectivamente, de 1991 a 2010.

Por outro lado, esses municípios apresentaram altos valores para o índice de Gini no intervalo analisado, o que significa uma alta desigualdade na distribuição de renda. De 1991 a 2010, esta desigualdade aumentou para nove dos 13 municípios. No mesmo período, o índice de Gini diminuiu 4,6% para o Brasil e 7,6% para Rondônia. A região Norte se manteve estável e o Estado do Amazonas aumentou em 7,6%.

O pesquisador sênior do Idesam, Mariano Cenamo, destaca que a análise deixa claro que o impacto da estrada já existe, independente do seu asfaltamento ou não. De acordo com Cenamo, isso pode ser constatado na região sul do Amazonas, onde há uma ocupação muito forte e um processo intensificado de comercialização de terras.

O estudo aponta que municípios com piores pontuações, Lábrea e Tapauá, ainda enfrentam problemas relacionados à ausência de acesso ao ensino básico e educação superior, aos serviços de nutrição e cuidados médicos básicos, além de abastecimento precário de água.

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