Como a castanha pode ser vetor de impulsionamento da Bioeconomia na Amazônia
Encontro do Meetup Acelera – edição Bioeconomia traz oportunidades, cases e atores conectados com a agenda de incentivos da Suframa
Texto: Steffanie Schmidt / Idesam
Fotos: Divulgação
O produto extrativista de maior expressão da Amazônia, a castanha-do-Brasil, pode ser um dos vetores de maior impacto de desenvolvimento social, de geração de renda e emprego e de sustentabilidade econômica e ambiental na Amazônia. Para isso, é preciso vencer os desafios de estruturação da cadeia, conexão de atores, de investimento em pesquisa e inovação e em boas práticas que vão da produção ao armazenamento e envase.
As condições para tornar a cadeia da castanha uma potência global baseada em uma nova economia, um modelo de desenvolvimento sustentável e inclusivo, nortearam o debate do quarto encontro do ‘Meetup Acelera – edição bioeconomia’, evento de conexão da comunidade de inovação realizado pelo Idesam, em parceria com o Impact Hub Manaus, onde ocorre a parte presencial; e a Fundação Rede Amazônica, responsável pela transmissão, ampliando o alcance da rede de atores em nível Amazônia. Confira AQUI.
Atualmente, a produção brasileira é baseada no extrativismo e está concentrada na Amazônia com 38.169 toneladas de castanha ao ano, segundo dados do IBGE de 2022. No entanto, boa parte dessa produção é comercializada in natura. Além disso, o Brasil exporta pouco, considerando seu potencial produtivo: a Bolívia chega a movimentar em torno de US$ 150 milhões com a exportação de castanhas. O Brasil só atinge 10% desse montante, segundo dados da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil).
Considerando que a produção é, na maioria, de origem extrativista, feita com práticas de sustentabilidade por comunidades e associações amazônidas, o investimento na cadeia ajudaria a transformar a realidade dessas comunidades, responsáveis pela manutenção da floresta em pé.
Com a experiência de coleta e comercialização de Castanha-da-Amazônia desde 2001, a Cooperativa Central de Comercialização Extrativista do Acre (Cooperacre) consegue exportar a castanha do Brasil para nove países diferentes. Possui duas usinas de beneficiamento que processa metade da sua capacidade, que é de 700 mil latas ao ano. “Hoje só processamos 350 mil latas, uma vez que não temos mercado garantido. Somos uma cooperativa pequena, dentro de uma Resex (Reserva Extrativista), localizada no extremo Norte do País, enfrentamos todo o tipo de dificuldade para estar no mercado e, mesmo assim, conseguimos entregar um produto embalado a vácuo com 1 ano de garantia”, afirmou o presidente da Cooperacre, José de Araújo, um dos debatedores convidados.
As boas práticas de coleta e armazenamento garantem a superação de um dos maiores entrave para a comercialização do produto, que é a presença de aflatoxinas, substância tóxica ocasionadas por fungos que se reproduzem em condições de umidade e temperatura elevadas, favorecido, também, pela precariedade do sistema de armazenamento. José de Araújo cita a falta de valorização dos serviços ambientais prestados pelo extrativista, que deveria receber pelo trabalho de conservação da floresta, como outro gargalo para o fortalecimento da cadeia.
A experiência do trabalho em rede é o segredo do sucesso de outra iniciativa que desde 1992 trabalha na cadeia da castanha. Bruno Dutra de Freitas, presidente da Cooperativa Mista dos Produtores Extrativistas do Rio Iratapuru (Comaru), trouxe, direto do Amapá, o case da cooperativa que passou a beneficiar o óleo desde 2021. “Juntos identificamos como processar melhor o produto – o que depende de como o armazenamos e o transportamos. A unificação das comunidades tradicionais, cooperativas e associações proporcionou um fortalecimento para conseguirmos acessar novos mercados, que pagam mais por conta dessa qualidade. Não se faz negócio na Amazônia sozinho”, afirmou.
Freitas cita o Coletivo da Castanha, que deu origem ao Observatório da Castanha-da-Amazônia (OCA), como exemplos dessa realidade de atuação conjunta. Trata-se de uma rede de extrativistas e organizações comunitárias que hoje organizam um ambiente de troca de informações sobre produção, estoques, comercialização, safras e percepções sobre a cadeia de valor, minimizando a assimetria de informações que prejudica a base produtiva da castanha-da-amazônia.
Foi pensando em como conectar esses atores em um ambiente digital que o Instituto Certi trabalhou em uma plataforma digital para resolver os principais gargalos da cadeia: um hub de market place da castanha onde cooperativas e associações que estão na Amazônia Legal podem entrar em negociação direta com a indústria; e o “Vende Onde?”, um software de rastreabilidade, onde se permite saber a origem do produto. “Estas são formas de agregar valor e geração de renda para as comunidades dentro do território, além de resolver o problema de saber de onde está vindo aquele produto e de prevenir a segurança do extrativista”, afirmou Rafael Gomes, representante do instituto.
Incentivos
“Buscar novos caminhos e não apenas ficar no modelo tradicional” é uma das saídas apontadas pelo advogado e economista Átila Denys, com atuação em negócios da Zona Franca de Manaus há mais 28 anos, por meio da DD&L Advogados. Convidado para o painel temático “Incentivos Suframa para a Bioeconomia”, o especialista é um investidor em vários negócios da agenda de produtos da sociobiodiversidade.
“Hoje o Brasil não reconhece, nem valoriza, um produto que entrega esses valores de sustentabilidade, algo que já está mais difundido no mercado estrangeiro. Estamos no ‘jardim de infância’ da bioeconomia, mas temos que começar. É uma agenda linda, que merece ser enfrentada e novos arranjos como o do Café Apuí Agroflorestal, que tem recurso de capital privado já mostram essa saída: o produtor se cadastra, recebe as mudas, planta no Sistema Agroflorestal, promove o reflorestamento e gera renda, além de receber futuramente pelos serviços de crédito de carbono, que também servirão para pagar esse empréstimo”, explica.
Tainara Tenorio, engenheira de operações na Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), atualmente Coordenadora de Gestão Tecnológica, explicou o funcionamento da Lei de Informática e seus subsídios para Amazônia Ocidental e o Amapá. “Bens de informática representam mais de 26.6% do faturamento Polo Industrial de Manaus, a maior parte, o que gerou em obrigação de investimento em Bioeconomia o montante de R$ 1,77 bilhão em 2022”, afirmou.
Os recursos previstos na Lei de informática são destinados a aceleradoras, incubadoras, fundos de investimentos, startup, Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs) e programas prioritários. Toda a execução é fiscalizada pela Suframa. Para ter acesso a esse recurso, é preciso ser uma unidade credenciada pelo Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (Capda), composto por representantes do governo federal, dos governos dos estados da Amazônia Ocidental. “Manaus corresponde a 56% de unidades credenciadas, aptas a recebe esse recurso, enquanto no interior do Amazonas estão outros 26%. Os demais estão nos estados que integram a região de atuação da Suframa”, afirma.
Atualmente, os programas prioritários vigentes da Suframa e que podem receber recursos do CAPDA são cinco: Economia Digital (R$ 49 milhões); Recursos Humanos (R$ 49 milhões); Bioeconomia (R$ 95 milhões); Indústria 4.0 (R$ 285 milhões); e Empreendedorismo Inovador (R$ 40 milhões). O Programa Prioritário em Bioeconomia (PPBio) é coordenado pelo Idesam desde 2019.
Novos negócios
Para o momento voltado ao Pitch de Novos Negócios da cadeia participaram as start-ups Apoena (Manaus-AM), que atua no ramo de agroindústria de produtos da sociobiodiversidade com a missão de valorizar as populações tradicionais a partir de novos processos; e a Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhecer – Coopavam (Juruena-MT), que envolve assentamentos e Terras Indígenas; e a Taberna da Amazônia, que tem conecta pequenos empreendedores da Região Norte, por meio do e-commerce, com o mercado consumidor nacional.
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