ARTIGO Mães da Amazônia: relatos da jornada materna e ativista
Artigo de Camila Garcêz
Foto: Dereck Mangabeira
Neste domingo, comemoramos o Dia das Mães, um dia para celebrar o afeto e a dedicação dessas mulheres. No Brasil, a data foi instituída por meio do decreto nº 21.366 de 1932 e foi uma grande vitória para o movimento de mulheres que crescia na época e que desencadeou no movimento sufragista. A verdade é que esse dia tão simbólico para a luta das mulheres, muitas vezes é tirado de seu contexto político e naturalizado como uma data para presentes e discursos clichês.
Bem, eu sou mãe também! E como uma mulher que vive a maternidade e todas as suas nuances, posso afirmar que para mim, o Dia das Mães é uma data para colocar as nossas vozes no mundo, para exigir direitos, respeito e dar visibilidade para esta função, que vai além do lugar de cuidado. Um dia para celebrar a nossa força, nossa dedicação dentro e fora do espaço privado, já que hoje ocupamos lugares de destaque no cenário político, institucional e público.
Eu fiz questão de me colocar como um personagem, nesta que não é bem uma matéria padrão no jornalismo. Aqui quero contar sobre como ser mãe é um grande desafio, em todos os sentidos. Somos milhares, conquistando espaço e voz no mercado de trabalho, seguindo jornadas duplas, muitas vezes triplas, para conciliar maternidade e a nossa independência.
Estive conversando com a Aparecida Martins, engenheira florestal e coordenadora de projetos do Idesam em Apuí, sobre como a maternidade impacta a nossa vida profissional. Não que ter um bebê abale a nossa produtividade (se você for uma mãe que ainda amamenta ou acorda de madrugada, desconsidere esta parte), mas que estamos constantemente precisando lembrar que temos nossas limitações, que precisamos da flexibilidade e que não existe a menor possibilidade de passar tanto tempo fora de casa sem ver os nossos filhos.
Aparecida me contou que tornar-se mãe a fez precisar mudar completamente seus padrões de trabalho, principalmente após a chegada do seu segundo filho. Ela é mãe da Isabella de 6 anos e do Arthur de 1 ano e 2 meses, e concilia as demandas da maternidade com as atividades de campo, seja dando apoio na produção de óleos na Associação Ouro Verde ou nas atividades de implantação de café e conservação da floresta, com a iniciativa Café Apuí Agroflorestal.
“A maternidade me fez pensar melhor numa rotina de trabalho. Principalmente porque precisei reorganizar as atividades de campo e os horários de trabalho estendido. Trabalhar e ser mãe não é uma tarefa fácil! São duas atribuições que exigem muita dedicação, e se a gente compara com alguém que não tem filhos, as minhas limitações de campo, de viagens e horários são bem maiores. Eu preciso da flexibilidade porque acredito que esse deve ser um direito para todas as mulheres. Não é fácil ser mãe e se dedicar ao trabalho fora de casa, mas estamos sempre conseguindo”, pontuou.
A gente sabe que nem sempre o mercado de trabalho é tão compreensível com as nossas necessidades. Não é uma novidade para nós mulheres saber da existência de mães que são demitidas por estarem grávidas, ou após a licença maternidade. Nós sabemos que empresas deixam de contratá-las apenas porque são mães e quando estão inseridas no mercado se sentem constantemente culpadas por trocar o filho pelo trabalho ou trocar o trabalho pelo filho.
Para Paola Bleicker, mãe do Bento de 7 anos e diretora executiva do Idesam, a maternidade também gerou uma grande necessidade de reorganização da sua agenda de trabalho e de prioridades. Ela, que é mais uma mulher (e mãe) em cargo de liderança dentro do Instituto, me disse que precisou ser cada vez mais solidária consigo mesma para aprender a diferenciar seu papel de mãe, do papel de heroína, daquela que dá conta de tudo.
“Desde que soube da minha gravidez, fui muito acolhida pela instituição e pela minha liderança na época. Dizer que foi fácil, seria uma inverdade, pois não deixa de ser um universo novo e desconhecido. Nós precisamos pensar em como conciliar os dois papéis, a dupla jornada, entendendo que cada uma delas sempre será muito singular. Acredito que quando contamos com uma rede de apoio – seja no campo pessoal ou profissional – tudo tende a fluir de maneira mais saudável e natural. No Idesam, falamos de impacto na Amazônia e comunidades, por isso, precisamos colher esses impactos com o nosso time. E em primeiro lugar precisamos cuidar de quem cuida da Amazônia”, explicou.
De fato, o Idesam me fez conhecer uma nova perspectiva de trabalho. O trabalho como extensão de um lar, como uma rede de apoio, que dá suporte e que fomenta o potencial das mulheres na defesa da Amazônia. A nossa floresta também é uma grande mãe repleta de filhos, e todos nós viemos dela e fazemos parte dela. É indispensável que as empresas, instituições e espaços públicos, sobretudo os que atuam em nossa região, estejam conscientes do nosso papel fundamental no serviço e na construção de um mundo melhor para os nossos filhos.
Sandra Barros, vice-presidente da Aspacs em Lábrea, me partilhou que para ela, a maternidade lhe serviu como um despertar para a luta pela conservação da floresta. Mãe de 4 filhos, Tomás, Talita, Thadson e Liliana, ela relatou como a maternidade lhe mostrou uma nova perspectiva sobre o amor, que ela desconhecia. “Ser mãe me fez mais forte, mais completa e me fez crescer muito como pessoa. Deixei de pensar só em mim e comecei a pensar no outro e no futuro. Meus filhos me motivaram a lutar pela floresta, e hoje é dela que vem o nosso sustento. Também tenho consciência de que o meu trabalho gera frutos e é por meio dele que estou garantindo um futuro melhor para meus filhos”, frisou.
Há dois anos me tornei mãe de uma menina chamada Lua. Com ela aprendo diariamente a ser espelho e a ser alguém por quem ela vai nutrir admiração. É na criação dela que vejo um futuro novo sendo construído. É por ela que acredito em um presente possível junto à luta das mulheres. E, ainda que mães carreguem consigo uma série de culpas maternas impostas por uma sociedade machista, sei exatamente que nenhuma de nós precisa interromper sua vida, sonhos e desejos apenas porque escolhemos nos tornar mães. Eu sei que a minha vida só estava começando e que eu renasci no dia que minha filha veio ao mundo.
Proponho que neste Dia das Mães façamos uma reflexão sobre como estamos tratando essas mulheres. Sobre como as nossas estruturas sociais precisam ser espaços de apoio e acolhimento para essas que são as responsáveis diretas pela vida e que se dedicam diariamente a construir um futuro melhor para todas e todos. Para as mães da Amazônia, desejo força para continuar lutando, apoio para seguir crescendo, incentivo emocional e financeiro para que vivam com dignidade, mas sobretudo, desejo que todas nós estejamos juntas, unidas, para seguir resistindo pelo bem mais precioso que podemos deixar aos nossos filhos: a floresta de pé e um futuro repleto de natureza.
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