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Inovação em bioeconomia aponta perspectivas para cadeia de valor na Amazônia 

Inovação em bioeconomia aponta perspectivas para cadeia de valor na Amazônia 

Agregar valor à produção e investimento em fortalecimento da gestão territorial aumenta capacidade de resiliência e entrega das comunidades frente a eventos extremos 

 Texto e foto: Steffanie Schmidt/Idesam

Aprimorar iniciativas de manejo combinadas ao incentivo a novas tecnologias aplicadas à piscicultura pode trazer uma nova perspectiva de impacto para comunidades tradicionais e pequenos produtores, promovendo a participação destas no mercado de pescado sem necessidade de concorrer diretamente com grandes fornecedores do segmento. E o que pode tornar esta realidade possível é agregar valor à matéria-prima ainda nos territórios, além de fortalecer a capacidade de gestão dessas comunidades na promoção de serviços ambientais, uma alternativa ao modelo de desenvolvimento praticado hoje que acelera os eventos extremos de seca e cheia na Amazônia.  

Estes foram os principais pontos de convergência entre os participantes convidados para as mesas de debate do terceiro Meetup Acelera – edição Bioeconomia, evento realizado pelo Idesam, Fundação Rede Amazônica (Fram) e Impact Hub Manaus, com transmissão ao vivo pelo Youtube da Fundação Rede Amazônica e G1 Amazonas.  

O encontro trouxe o tema “Unidades de Conservação como processo de inovação” conectado ao segmento de Manejo de Pesca e Piscicultura. Pesquisadores, empreendedores, startups e demais atores do segmento promoveram a conexão de experiências e possíveis soluções para os desafios da cadeia produtiva.   

“Apoio e fomento a usinas de beneficiamento são importantes para ajudar a agregar valor a esse produto da sociobiodiversidade. Uma vez que desenvolvemos uma atividade de manejo, estamos cuidando da fauna e da flora desses locais, todo o ecossistema se beneficia e o mercado precisa reconhecer que essas atividades prestam serviços ambientais”, afirmou Dione Torquato, secretário-geral do Conselho Nacional dos Seringueiros, hoje Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS).  

“Essa uma é reflexão que precisamos fazer e agir: olhar os territórios como valorização do modo de vida dessas populações para uma contribuição global, uma vez que as crises que estamos passando, de forte estiagem, têm a ver com o comportamento humano que vem acelerando, nos últimos 30 anos, os fatores extremos climáticos. Que modelo de desenvolvimento que queremos? Que legado essa sociedade vai deixar? Os territórios tradicionais são espaços estratégicos para pensar um modelo diferente”, completou Torquato.  

O pesquisador na Empresa Brasileira Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Laurindo Rodrigues, trouxe a visão da piscicultura como um modelo inovador a partir de uma visão ecossistêmica 

“Hoje o Brasil produz 860 mil toneladas de peixe, sendo 250 mil de peixe nativo, mas isso não é bioeconomia. É preciso garantir algum ganho social e econômico para as comunidades, a partir da eficiência da produção. A aquicultura regenerativa consegue isso: unindo técnicas de piscicultura com segurança e soberania alimentar”, explicou. No Amazonas, a produção atinge o quantitativo de 20 a 22 mil toneladas, desde 2020, o que não supre o consumo local.   

Rodrigues trouxe ainda a possibilidade de a piscicultura contribuir com repovoamento de um ecossistema, o que, no caso da seca extrema pela qual passa o Amazonas, seria útil. “Se não houver condições de regenerar esse ecossistema, a piscicultura seria essa reserva pronta para ajudar no repovoamento. A bioeconomia de ser o desenvolvimento de um sistema produtivo que favoreça o ambiente e a sociedade, reaproveitando o que já se tem à mão”.  

Conexões entre startups 

A conexão entre atores que já atuam nas cadeias de valor da bioeconomia aponta para a necessidade de criar e fortalecer a comunidade de inovação na Amazônia. Atuando no desenvolvimento de piscicultura em pequenas áreas, de até 1 ha, a Gigasus, start up que tem apoio do Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio), coordenado pelo Idesam, dentificou que é possível produzir mais do que em 5 ha  no sistema convencional, o que torna a produtividade estratégica para o ganho de escala, mesmo para sistemas de produção familiar. O resultado se deve ao melhor controle dos ciclos produtivos, adensamento da quantidade de animais, menor uso de recursos hídricos a partir da recirculação de água.  

“Precisamos fazer a virada de chave em relação à produtividade e à tecnologia e inovação porque isso vai garantir segurança contra possíveis atravessadores e ter uma harmonia entre a piscicultura e o manejo, um complementa o outro e não precisam concorrer com o que abastece Manaus hoje. Há interesse de países europeus por esse produto já beneficiado. Pode-se, inclusive, aplicar esse beneficiamento ao pescado in natura que chega de Rondônia e Roraima”, afirmou Esner Magalhães, fundador da Gigasus.  

O beneficiamento do couro de peixe é outro exemplo de como melhorar o aproveitamento dessa cadeia, experiência que já está em prática pela startup Yara Couro, um dos negócios selecionados no Amapá para receber fomento do PPBio “Fizemos uma modelagem inteligente do ecossistema e passamos a olhar para aquilo que não era aproveitado. Falta ainda um mapeamento de dados do quanto temos à mão, por enquanto, temos o dado do frigorífico com o qual trabalhamos. A nossa missão é causar um impacto positivo dentro da cadeia, levantando todo mundo junto, gerando renda e uma nova perspectiva para algo que até então não era comercializado, que é a pele do peixe”, afirmou Bruna Freitas, representante da startup.  

Responsável por acompanhar 13 áreas de manejo de pirarucu, o Instituto Mamirauá consegue beneficiar mais de 6 mil pessoas em 22 municípios no Amazonas. A renda que, no início era R$ 1 mil em média, hoje chega a R$ 3,7 mil. “Os benefícios vão muito além dos impactos em relação à espécie, incluindo a recuperação e manutenção da mesma: ele favorece o empoderamento dessas comunidades, promove a segurança alimentar e a conservação do meio e de outras espécies, apenas para citar alguns”.  

O sistema de manejo do pirarucu, baseado em um conhecimento tradicional da população tradicional que faz a contagem manual dos peixes, foi validado cientificamente e reconhecido como tecnologia social, um selo que confere um valor agregado à produção.  

“Esse evento dramático, que hoje atinge as comunidades, deixando-as isoladas, representa a falta de estrutura e de conhecimento que não são suficientes para que elas possam se planejar. Daí se faz necessário o investimento em ciência, necessário para prever isso. O investimento em bioeconomia também é fundamental: muito mais que tecnologia e infraestrutura, é fortalecer esses empreendedores que estão fazendo hoje, muito por eles mesmos, praticamente sem fomento do governo, inovações que ajudam todos da cadeia”, afirmou o biólogo Emiliano Ramalho, pesquisador do Instituto Mamirauá.  

Novos Negócios 

No momento Pitch Day, três novos negócios apresentaram suas ideias ao público presente: a Bactolac, que trabalha com microrganismos (bactérias) com potencial probiótico de melhora no cultivo de peixes, desenvolvido de forma específica para cada espécie; o Lab AQUA, que desenvolveu tecnologia social de reaproveitamento da água a partir de filtragem com material da floresta, como caroço de açaí, garantindo um resultado de produção de 2kg por metro cúbico para até 30 kg por metro cúbico de água; e a Peixe Brabo, 1ª startup de Presidente Figueiredo (AM), formada por alunos do curso de Engenharia de Aquicultura que desenvolveram uma plataforma de base de dados dos piscicultores para o gerenciamento da produção e conexão dos produtores com órgãos públicos e mercado consumidor.   

Próximos eventos 

No dia 09 de novembro, o debate do ecossistema de bioeconomia traz o tema “Incentivos Suframa para o agroextrativismo” com atores envolvidos na cadeia da castanha como Coopaiter, do povo Paiter Suruí, que abordará exemplos de boas práticas; a startup Vem de onde?, que compartilhará o case de rastreabilidade; e o novo negócio Petit Suisse, que apresentará novos produtos beneficiados a partir da castanha.  

O último Meetup Acelera do ano acontecerá no dia 05 de dezembro, com o tema Estratégia de lançamento de produtos com marca Amazônia, trabalhando a cadeia do reflorestamento com as startups convidadas Peabiru, Onisafra e Rastreabilidade.  

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