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Entraves do manejo florestal comunitário impedem o pleno desenvolvimento do setor no AM

Entraves do manejo florestal comunitário impedem o pleno desenvolvimento do setor no AM

Seminário Manejar joga luz sobre desafios e soluções da produção florestal familiar no Estado

 

Texto: Henrique Saunier
Imagem: Divulgação/Agência Brasil 

 

Considerado uma alternativa para a conservação dos recursos naturais e para a melhoria da qualidade de vida dos povos e comunidades tradicionais, o manejo florestal comunitário ainda enfrenta desafios que impedem a exploração do potencial madeireiro da região amazônica. Dificuldades para a comercialização, escoamento e de inserção de novas tecnologias no setor são apenas algumas das barreiras, que serão devidamente discutidas no primeiro Seminário Manejar, uma oportunidade para abordar o universo da produção florestal familiar e comunitária no Amazonas, de 26 a 28 de novembro, em Manaus.

O Seminário Manejar faz parte das ações do projeto ‘Cidades Florestais’, que dentre outras frentes de atuação, busca desenvolver o manejo florestal madeireiro na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã. Gerente do projeto e um dos responsáveis pela organização do seminário, André Vianna afirma que a baixa exploração dos planos de manejo sustentáveis de pequena escala – apenas 20% são efetivamente explorados comercialmente no Amazonas – esbarra muitas vezes em questões como a falta de assistência técnica, de financiamentos e maquinários adequados.

Não fosse o bastante, o setor ainda enfrenta a competição com a madeira ilegal, o que acaba achatando os preços do mercado legal. Sem muita saída, o manejador compete com o produto ilegal de maneira desleal. A baixa exploração dos planos de manejo também significa que há recurso público investido para uma atividade que, no final das contas, não gera o retorno esperado.

“Isso tudo influencia na motivação do produtor em continuar no manejo e a possibilidade de se esquentar madeira de forma ilegal. São vários pontos negativos. Esses problemas são coisas que o projeto Cidades Florestais busca combater, por meio da facilitação do acesso a maquinários e capital de giro para exploração, promovendo assistência técnica durante toda a atividade de manejo”, ressalta Vianna.

O fomento da atividade florestal de produtores familiares também envolve as particularidades do modelo de produção, especificidades que passam ainda pela organização social e pela gestão de recursos, com cenários muitas vezes bem diferentes da realidade dos empreendimentos de iniciativas privadas. A própria distância geográfica que separa o manejador do público consumidor é um desafio, já que escoar a produção para uma área com consumo maior de madeira leva tempo, causando o encarecimento do produto e desestimulando o comprador.

“Apesar de ter toda essa dificuldade em licenciar e vender, o valor da madeira certificada é muito maior e você tem mais segurança e tranquilidade para trabalhar. A maioria dos locais onde atuamos não levamos o manejo apenas por levar. São locais que já trabalham com madeira e queremos legalizar a atividade deles. São pessoas que trabalhavam ou ainda trabalham de forma ilegal, muitas vezes por necessidade de obter o dinheiro mais rápido, mas geralmente por um preço bem baixo”, explica Vianna.

Dados compilados pelo Idesam na publicação “Evolução do Manejo Florestal para Pequenos Produtores no Amazonas” (2017) apontam que a média de madeira licenciada no Amazonas é de aproximadamente 394 mil metros cúbicos (m³), por ano, frente uma demanda interna anual de 2 milhões de m³ de madeira. Soma-se esse abismo entre oferta e demanda a participação pouco expressiva dos planos de manejo de pequenos produtores em relação ao volume total licenciado, que representa menos de 4% (chegando a marcar apenas 2% do total em 2014, por exemplo).

Benefícios superam custos operacionais

No livro “Manejo Florestal Comunitário na Amazônia Brasileira: situação atual, desafios e perspectivas”, os autores Paulo Amaral e Manuel Amaral Neto já abordavam, no início dos anos 2000, a situação do uso das florestas, que poderiam ter um rumo diferente se técnicas de manejo florestal fossem adotadas.

Para os especialistas, as experiências de práticas de manejo florestal mostram que os seus benefícios econômicos superam os custos adicionais, sendo que em curto prazo, “os benefícios decorrem do aumento da produtividade do trabalho e da redução dos desperdícios de madeira”. Já em longo prazo, os benefícios resultariam no maior crescimento das árvores remanescentes e maior rendimento dos produtos não-madeireiros, em virtude da redução dos danos ambientais.

A publicação afirma, ainda, que “estudos demonstram que é possível manejar economicamente e ecologicamente as florestas para a produção de madeira”, mas que as empresas e grupos envolvidos com projetos comunitários têm pouca experiência em manejo, necessitando de apoio técnico, treinamento e capacitação administrativa para que suas iniciativas pudessem lograr êxito.

É exatamente esse um dos pontos que o produtor Gracilázo Miranda, da Comunidade São Francisco do Caribi (AM), afirma ser um dos mais prejudiciais no desenvolvimento da atividade: a falta de acompanhamento técnico e de estrutura dos próprios órgãos certificadores.  Com maquinário e alto interesse em explorar o manejo florestal na área da RDS do Uatumã, Miranda destaca a importância de se trabalhar na legalidade e atua junto com o Idesam na conscientização de outros produtores locais.

“Hoje falta muita estrutura e apoio, inclusive financeiro. A maior dificuldade é a falta de acompanhamento técnico, e eu tenho interesse em fazer (o manejo) no meu terreno, mas não consegui por questões burocráticas. Os próprios órgãos competentes já nos informaram que não possuem recursos para ir a campo acompanhar”, destaca o produtor que, pela Associação Agroextrativista da RDS do Uatumã, possui potencial para manejar 600 m³ de madeira, anualmente.

Mais do que apenas uma mera obrigação, a certificação florestal representa, ainda, uma alternativa para aumentar a demanda por produtos de manejo sustentável. Em um mercado mundial que cada vez mais tende a discriminar produtos provenientes de práticas depredadoras das florestas, o manejo de pequena escala pode ser uma saída para que comunidades economicamente isoladas encontrem um caminho para um desenvolvimento consciente.

 

O Seminário

Essas e muitas outras questões e desafios do manejo florestal de pequena escala serão abordados no Seminário Manejar, que realiza sua primeira edição, no Bosque da Ciência, em Manaus, de 26 a 28 de novembro, contando, ainda, com duas atividades de campo pré-evento.  Um dos destaques da programação, a plenária “Desafios e soluções para o manejo florestal de pequena escala” acontece no dia 27 de novembro.

Com inscrições abertas pelo site http://manejar.org.br/, serão oferecidas capacitações e treinamentos de curta duração destinados a melhorias dos processos de produção florestal familiar e comunitária.  O evento também irá apresentar novos equipamentos e máquinas para a produção florestal, tendo como público-alvo principal produtores familiares, pesquisadores, colaboradores de instituições de apoio ao setor e estudantes.

O Seminário também vai proporcionar um momento de exposição de produtos de organizações sociais, assim como, uma Rodada de Negócios de produção de madeira manejada e produtos florestais não madeireiros. O evento é uma realização do Projeto Cidades Florestais do Idesam, em conjunto com a Fundação Amazonas Sustentável (FAS). O Seminário conta como principal apoiador o Fundo Amazônia/BNDES.

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